Economia chinesa: O Dragão Asiático
Soluções para a tarefa
Em meados de julho de 2003, levantou-se um coro de vozes norte-americanas contra a China, acusando-a de ser responsável pelo déficit comercial crônico dos Estados Unidos, pelo aumento do desemprego e pela desindustrialização dos setores têxtil e eletrônico. “Estão matando a indústria manufatureira [norte-americana]”, fulminou o senador Charles Schumer no dia 16 de julho. “A desvalorização artificial do yuan chinês provoca uma inundação de produtos estrangeiros mais baratos, com os quais nossas sociedades não podem competir”, declarou, por seu lado, a senadora Elisabeth Dole. “Os chineses não respeitam seus acordos comerciais… É preciso que o Tesouro estude a questão e adote as medidas apropriadas para garantir que os chineses não continuem desvalorizando sua moeda em prejuízo de nossa produção interna”, acrescentou o senador Lindsey Graham1.
Depondo, na véspera, perante o Congresso, Alan Greenspan, presidente do Banco Central (Federal Reserve, FED), reforçou esses argumentos afirmando que as moedas da China e de outras economias do Sudeste Asiático eram subvalorizadas e que esses países não podiam continuar acumulando indefinidamente reservas tão importantes de divisas estrangeiras2.
Dado o sinal de partida, os senadores solicitaram oficialmente ao Departamento do Tesouro norte-americano que este pressionasse a China para que suprimisse o controle cambial e deixasse flutuar sua moeda – o yuan -, cuja cotação é de 8,3 para um dólar. Esse furor nacionalista decresceu ligeiramente no mês de agosto, mas o secretário do Tesouro, John Snow, voltou à ofensiva em setembro, por ocasião de uma viagem pela Ásia, exortando a China a “deixar o mercado fixar o valor de sua moeda”. Eis aí uma curiosa atitude, vinda de um governo que necessita terrivelmente da ajuda de Pequim para resolver a questão da Coréia do Norte e da segurança regional asiática.
Novo epicentro na Ásia
No entanto, convém estar preparado para que a ofensiva prossiga nos próximos meses e anos, visto que os Estados Unidos irão enfrentar déficits comerciais crescentes e a China – um dos raros centros de crescimento da economia mundial – se tornará o epicentro da integração econômica regional da Ásia Oriental. Na realidade, esta ofensiva contra a Ásia não decorre apenas da volta de uma diplomacia comercial agressiva por parte dos Estados Unidos, refletindo a versatilidade da política interna norte-americana. Traduz também uma antiga preocupação, subjacente à idéia do abalo sísmico que se anuncia com a distribuição do poder econômico mundial em proveito da Ásia Oriental – e, mais precisamente, da China.
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Os EUA irão enfrentar déficits comerciais crescentes e a China se tornará epicentro da integração econômica asiática
A ambigüidade dos Estados Unidos em relação ao dinamismo econômico dos “tigres” e dos “dragões” já era perceptível na década de 80, quando a onda de comentários a propósito do “milagre asiático” se fez acompanhar de advertências alarmistas contra o mercantilismo e a ameaça da concorrência asiática. Pela primeira vez, desde 1918, os Estados Unidos tornaram-se, nessa época, um país devedor, enfrentando déficits no orçamento e na balança comercial. Assim como se faz hoje com a China, o Japão e os países recém-industrializados da Ásia Oriental foram acusados de esvaziar a tessitura industrial do Ocidente e submetidos a duras pressões, exortando-os a revalorizar suas moedas e a abrir suas economias e seus sistemas financeiros ao comércio e aos investidores norte-americanos.
Em 1985, o governo de Ronald Reagan engendrou uma revalorização do iene em 50%, por meio dos chamados Acordos do Plaza. Impostos a aliados estruturalmente dependentes dos Estados Unidos e sem qualquer margem de manobra, estes acordos, supostamente, iriam estimular, de forma automática, as exportações norte-americanas e diminuir a competitividade industrial do Japão. As conseqüências dessa política, no entanto, foram inesperadas: a valorização do iene tornou o Japão, de um dia para o outro, o maior credor do mundo. E acelerou a integração econômica regional na Ásia, levando as empresas japonesas a deslocarem para o Sudeste Asiático suas atividades de exportação de baixo valor agregado. Essa reestruturação da capacidade manufatureira japonesa criou, rapidamente, uma divisão de trabalho regional na Ásia Oriental tendo o Japão como centro