História, perguntado por giannagiffoni, 1 ano atrás

Durante a idade média o que indicava que uma pessoa havia cometido bruxaria

Soluções para a tarefa

Respondido por igorantunes029
4
As pilhas de lenhas e gravetos já estavam acesas e a multidão inquieta, aguardava o início do ritual que conhecia tão bem. Afinal, execuções eram espetáculos imperdíveis, que atraiam a atenção de pessoas vindas de vários cantos. Em meio ao ruído abafado dos comentários sobre os horrores que havia cometido, surgiu enfim a condenada. A turba, que já estava agitada, aproveitou para liberar a tensão reprimida: objetos, palavras de ódio, risos e piadas partiam de todas as direções contra a terrível criatura. Não houve muitas delongas. A sentença foi lida rapidamente, o carrasco, num gesto piedoso, estrangulou a condenada para que não enfrentasse as chamas viva e, em poucos minutos, seu corpo ardia, diante da aclamação selvagem da assistência. Durante mais de 300 anos, cenas como essa se tornaram corriqueiras nas praças públicas de boa parte da Europa e o caminho da fogueira se transformou no destino de milhares de mulheres. Nuas, montadas em vassouras, aterrorizando cidades, aldeias e castelos, no imaginário popular e religioso da época, as bruxas estavam por toda parte, semeando o pavor. A perversidade feminina campeava solta, a serviço dos mandos do demônio e precisava ser contida qualquer custo. De 1450 a 1750, poucas pessoas ousariam contradizer essa doutrina, repetida em tom de ameaça nos púlpitos dos pregadores católicos, assim como nos sermões protestantes depois da Reforma religiosa de Martinho Lutero no século XVI. Bruxaria era uma calamidade tão real quanto tempestades ou pestes, e intimamente ligada à natureza feminina. Com exceção de Portugal e Espanha, onde os principais perseguidos eram cristãos novos e judeus, em quase toda a Europa a porcentagem de mulheres excedeu 75% dos casos. Em algumas localidades, como o condado de Namur (atual Bélgica), elas responderam por 90% das acusações. Estima-se que 100 000 processos foram instalados pelo continente afora e pelo menos 60 000 vidas se perderam em meio às chamas. Foi em plena Idade Moderna — a mesma que presenciou a descoberta de um novo mundo com as grandes navegações, a ascensão da burguesia comercial, o fim do domínio feudal e a formação dos primeiros Estados nacionais europeus — que o temor às forças do mal deixou o campo da crendice popular para se tornar alvo de uma perseguição sistemática de tribunais leigos, religiosos e da Inquisição — sob controle papal. Não que as fogueiras tenham sido estranhas à sociedade medieval. A Idade Média também presenciou exibições do poder purificador das chamas, a mais notável delas, sem dúvida, aquela que consumiu a vida da jovem Joana d’Arc em 30 de maio de 1431, na cidade de Rouen, então sob domínio inglês. Heroína nacional, Joana ficou famosa depois que conduziu o exército francês à vitória sobre os ingleses em Orléans e deu início à revanche de seu país na Guerra dos Cem Anos (1337-1453), até aquele momento vencida fragorosamente pelos britânicos. Em 1430, quando caiu prisioneira nas mãos do duque de Borgonha, aliado ao rei inglês Henrique V, seus inimigos aproveitaram a fama das visões que ela costumava ter desde pequena para levá-la à fogueira, mesmo sabendo de sua extrema devoção religiosa. Nesse caso, porém, o cunho político da condenação era tão óbvio, que antes do final daquele século ela seria reabilitada e em 1920 finalmente transformada em santa. Para bruxas menos famosas, no entanto, a chegada da Idade Moderna trouxe uma mudança radical na atitude da igreja e dos tribunais em relação ao universo da superstição, do paganismo e do mito com o qual, havia mais de 1500 anos, a Europa convivia. Na mitologia romana, Diana, deusa dos bosques e dos animais, já costumava guiar amazonas noturnas em cavalgadas celestes. Entre as crenças imemoriais germânicas, acreditava-se que figuras ameaçadoras, conhecidas como streghe, se reuniam na floresta em torno de caldeirões para realizar seus rituais. Depois se volatilizavam e invadiam as casas para chupar a vitalidade das crianças. Mas em meio à insegurança da aurora da modernidade, um tempo marcado por mudanças e desgraças contentes como fomes, pestes, guerras e conflitos religiosos, boa parte dessa tradição fantasiosa do passado acabou associada à certeza de que o demônio e suas seguidoras estavam determinados a dominar o mundo. Feitiços e mulheres voadoras tornaram-se, da noite para o dia parte te de uma grande conspiração demoníaca. Encantos e ungüentos — chamados na época de maleficia — que antes serviam para ajudar as pessoas se transformavam em passaporte certo para a morte.Não era preciso muito para provar que a ação infernal estava em andamento. Além das tradicionais acusações de possessões diabólicas, crises políticas e sociais, calamidades naturais ou qualquer outro acontecimento anormal eram capazes de detonar a mortandade.


Perguntas interessantes