Desejo e amor. Irmãos. Por vezes gêmeas; nunca, porém, gêmeos idênticos (univitelinos)
Desejo é vontade de consumir. Absorver, devorar, ingerir e digerir – aniquilar. O desejo não precisa ser instigado por nada mais do que a presença da alteridade . Essa presença é desde sempre uma afronta e uma humilhação. O desejo é o ímpeto de vingar a afronta e evitar a humilhação. É uma compulsão a preencher a lacuna que separa da alteridade, na medida em que esta acena e repele, em que seduz com a promessa do inexplorado e irrita sua obstinada e evasiva diferença. O desejo é um impulso que incita a despir a alteridade dessa diferença; portanto, a desempoderá-la. Provar, explorar, tornar familiar e domesticar. Disso a alteridade emergiria com o ferrão da tentação arrancado e partido – quer dizer, se sobrevivesse ao tratamento. Mas são grandes as chances de que, nesse processo, suas sobras indigestas caiam do reino dos produtos de consumo para o dos refugos.
Os produtos de consumo atraem, os refugos repelem. Depois do desejo vem a remoção dos refugos. É ao que parece, como forçar o que é estranho a abandonar a alteridade e desfazer-se da carapaça dissecada que se congela na alegria da satisfação, pronta a dissolver-se tão logo se conclua a tarefa. Em sua essência, o desejo é um impulso de destruição. E, embora de forma oblíqua, de autodestruição: o desejo é contaminado, desde o seu nascimento, pela vontade de morrer. Esse é, porém, seu segredo mais bem guardado- sobretudo de si mesmo.
O amor, por outro lado, é a vontade de cuidar, e de preservar o objeto cuidado. Um impulso centrífugo, ao contrário do centrípeto desejo. Um impulso de expandir-se, ir além, alcançar o que “esta lá fora”. Ingerir, absorver e assimilar o sujeito no objeto, e não vice-versa, como no caso do desejo. Amar é contribuir para o mundo, cada contribuição sendo o traço vivo do eu que ama. No amor, o eu é, pedaço por pedaço, transplantado para o mundo. O eu que ama se expande doando-se ao objeto amado. Amar diz respeito a auto sobrevivência através da alteridade. E assim o amor significa um estímulo a proteger, alimentar, abrigar; e também à caricia, ao afago e ao mimo, ou a – ciumentamente- guardar, cercar, encarcerar. Amar significa estar a serviço, colocar-se à disposição, aguardar a ordem. Mas também pode significar expropriar e assumir responsabilidade. Domínio mediante renúncia, sacrifício resultando em exaltação. O amor é xifópago da sede de poder- nenhum dos dois sobreviveria à separação.
Se o desejo quer consumir, o amor quer possuir. Enquanto a realização do desejo coincide com a aniquilação de seu objeto, o amor cresce com a aquisição deste e se realiza na durabilidade. Se o desejo se autodestrói, o amor se autoperpetua.
Tal como o desejo, o amor é uma ameaça ao seu objeto. O desejo destrói seu objeto, destruindo a si mesmo nesse processo; a rede protetora carinhosamente tecida pelo amor em torno de seu objeto escraviza esse objeto. O amor aprisiona e coloca o detido sob custódia. Ele prende para proteger o prisioneiro.
Desejo e amor encontram-se em campos opostos. O amor é uma rede lançada sobre a eternidade, o desejo é um estratagema para livrar-se da faina de tecer redes. Fiéis a sua natureza, o amor se empenharia em perpetuar o desejo, enquanto este se esquivaria aos grilhões do amor.
Zygmunt Bauman- Amor Líquido: Sobre a fragilidade dos laços humanos.
Reflexão: Após a leitura do texto, proponho uma reflexão sobre o tema do desejo e do amor, com as questões discutidas em sala referente ao consumo e consumismo. Como discutimos, os efeitos do fenômeno consumismo vão além da esfera econômica, ou seja, eles atingem pontos mais específicos, particulares, que por vezes passam despercebidos, como, por exemplo, o impacto na vida cotidiana e na existência do sujeito. Assim como a esfera econômica modifica o modo de produção, há também o impacto sobre as questões humanas, como os relacionamentos e os sentimentos envolvidos, como o amor. A proposta é que você crie uma reflexão articulando as seguintes questões: Amor, desejo, consumo e consumismo.
O Tema da proposta é: Como em tempos modernos, em pleno século XXI, sustentar relações sólidas e duradouras quando nos deparamos diante da velocidade inevitável dos acontecimentos, assim como da fragmentação do indivíduo?
Como sustentar relações sólidas em um universo que prega o descartável?
OBS: Sua reflexão deve ter no mínimo 30 linhas. Não há limite máximo de linhas.
Soluções para a tarefa
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Bauman define a modernidade líquida a partir da ideia que a modernidade é imediata, ou seja, ela se relaciona com o tempo e as mudanças dinâmicas da sociedade moderna.
Por isso, ele define a liquidez moderna como uma infinidade de experiências negativas, que geram um afastamento do indivíduo, aumentando a exclusão e afirmando a insegurança na população.
Por fim, a modernidade líquida está para o individualismo, para as disputas de classe e gênero o que nos atenta para a necessidade de estarmos sempre buscando novos conhecimentos,
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