DE QUE FORMA A POLÍTICA DO GOVERNO EXERCE DOMÍNIO SOBRE OS POVOS INDÍGENAS?
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Resposta:
Explicação:O Brasil republicano (1899) emergiu de um recente passado colonial, trazendo consigo os legados institucionais e simbólicos da monarquia, da escravidão e da fusão entre a Igreja e o Estado. Em que pese o afã modernizador do Segundo Império brasileiro, as elites mestiças governantes da República tinham grandes desafios a enfrentar: um heteróclito e enorme território, mitificado desde a chegada dos colonizadores portugueses como a sede de inúmeros eldorados e quimeras, dotado de um vasto litoral; um contingente humano composto por populações múltiplas - imigrantes vindos da Europa do Norte, negros de origem africana, negros crioulos, as populações indígenas dessa porção das Américas e uma massa de mestiços que consistiria nos quadros da burocracia de um Estado nacional em expansão. Em suma, o mapa de um país, entidade jurídica, em que a palavra "desconhecido", tarjada sobre grandes extensões, era dos mais frequentes termos.
Como, de tal caleidoscópio, forjar um povo que se sentisse pertencente a uma pátria brasileira? Como fazer este povo brasileiro ocupar e tornar-se guardião de tão vastos espaços mantendo o controle restritivo do acesso a terra, seguindo o dístico da bandeira republicana, ordem e progresso? Seria possível conceber que de tal emaranhado saísse uma civilização? Seria possível conservar íntegro um território apenas juridicamente brasileiro, mas em realidade incógnito, agora que o emblema imperial esvanecera-se enquanto signo de uma forma de totalização, evitando-se o fantasma da fragmentação das colônias espanholas na América, fantasma permanente dos militares brasileiros curiosamente ainda hoje? Como defender esta vastidão da entrada de estrangeiros? Que métodos utilizar para tanto? Como fixar as "fronteiras da nação"?
A virada do século XIX para o XX colocava para a classe dominante brasileira, de base eminentemente agrária e por tradição escravista, alguns desafios à manutenção de sua hegemonia sob um novo quadro histórico, caracterizado por mudanças importantes que se implantaram em ritmos e tempos distintos. Dentre estas mudanças, três das mais significativas foram: 1. o término jurídico da escravidão e a necessidade de instauração de uma ordem baseada na liberdade, ainda assim mantendo controle sobre o acesso a terra e sobre a força de trabalho de estratos sociais hierarquicamente inferiores da população, em especial os libertos e seus descendentes; 2. a necessidade de construção efetiva de um aparato administrativo de Estado, com o fim do Real Padroado, logo, do papel de "unidades administrativas mínimas", desempenhado por longo tempo pelas paróquias (com a paralela redefinição ou o surgimento de unidades administrativas propriamente eclesiásticas sobre certos segmentos sociais); 3. a redefinição dos modos de se imaginar e de se pertencer a uma comunidade política nacional sob um regime republicano federativo.
Foi sob tal quadro de questões mais amplas que se constituiu o primeiro serviço de Estado no regime republicano voltado aos povos indígenas, o Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais, criado em 1910, e que passaria a apenas Serviço de Proteção aos Índios já em 1918.
1 O SPI surgiu como resposta aos inúmeros conflitos resultantes de mais uma vaga de ocupação e exploração territorial em diversos pontos do país, dentro dos quadros de um Estado em expansão e de atividades econômicas que penetravam em regiões ocupadas por povos indígenas em estado de guerra contra seus invasores. Na contramão do discurso fundador do SPI, busquei pensar as ações governamentais sobre os indígenas não apenas como demonstração de bondade e generosidade, forma abnegada de proteger aquele que é tomado como incapaz de participar plenamente numa comunidade política, como ato humanitário, mas também de inseri-las como parte dos processos de formação de Estado, de extensão de sua malha administrativa através da articulação de âmbitos domésticos e públicos, de uso do trabalho indígena e, mais importante, de liberar terras aos interesses econômicos de grupos privados.