Da primeira república, e hoje, o processo eleitoral é confiável?
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Em outubro, quase 143 milhões de brasileiros estarão aptos a ir às urnas. A maioria deles acostumados a escolher um candidato pela urna eletrônica, em um processo reconhecido como universal, seguro e ágil. Mas nem sempre foi assim. E o Brasil precisou percorrer um longo caminho até chegarmos aqui. A Rádio Câmara apresenta nesta semana uma reportagem especial, em dois capítulos, sobre a história do voto no país e os desafios para tornar nosso processo eleitoral cada vez mais transparente e democrático.
A história do voto no Brasil começou quando ainda éramos colônia de Portugal. A estreia foi em 1532, com a eleição dos membros do Conselho Municipal da Vila de São Vicente, em São Paulo. Mas naquela época o sistema não era unificado para todo o território nem muito menos para todos. Ao longo da colônia e, mesmo após a independência do país e a chegada do período imperial, voto era para quem tivesse uma renda mínima. E a lisura do processo não parecia uma preocupação.
Um pouco antes da chegada da República, ainda durante o Império, instituiu-se, em 1881, o título de eleitor, mas sem foto, o que não impediu as fraudes.
Veio a República, em 1889, mas as adulterações continuaram. Por outro lado, o voto deixou de ser censitário, ou seja, determinado pela renda, mas seguia vetado a menores de 21 anos, mulheres, analfabetos, soldados rasos, indígenas e integrantes do clero.
O cientista político Paulo Kramer avalia que a principal mudança no perfil das eleições do Brasil está na ampliação gradativa do número de participantes no processo eleitoral:
"Na República Velha, de 1889 a 1930, só para ter um exemplo, não participavam nem 10% da população nas eleições. Voto feminino ainda não havia sido aprovado. O que você tem de 1930, 32 mais precisamente, quando foi aprovado o primeiro código eleitoral, já permitindo voto feminino, e com mais força, do final da Segunda Guerra, de 1945, com a redemocratização, e do fim do Estado Novo para cá? Esse eleitorado só tem feito crescer acompanhando a tendência à urbanização, industrialização do país."
O primeiro código eleitoral, de 1932, trouxe também o voto secreto. E, em 1955, as eleições passaram a envolver cédulas e um título eleitoral com foto.
Em 1964, seguiu-se um período de duas décadas de ditadura militar no país, quando, entre inúmeras restrições de direitos, o voto também foi afetado. O brasileiro somente voltaria a eleger diretamente um presidente em 1989. Durante o regime militar, por vezes, se permitiu a eleição para cargos proporcionais, prefeito ou governador, mas dentro de um sistema bastante restrito e conturbado.
Em 1985, após a frustração das Diretas Já, finalmente o país conquistou na lei o voto direto para presidente. A partir de então, analfabetos e maiores de 16 anos também passaram a ter o direito de participar das eleições. A Constituição de 1988 abriu a possibilidade do voto a detentos, o que foi viabilizado em 2010.
Além das mudanças na lei, a Justiça Eleitoral também foi buscando novas normas e procedimentos para ampliar a segurança e participação dos brasileiros nas eleições. Em 1986, a Justiça passou a cadastrar os eleitores nacionalmente. Até então, o registro estava nas mãos dos estados, o que gerava insegurança quanto à duplicidade e transferência entre os estados.
O cientista político Jairo Nicolau destaca que, hoje, a mecânica de votação no Brasil não está mais sob suspeita:
"Claro que ainda há um pouco de corrupção eleitoral, mas vários passos foram dados, como voto secreto, mais recentemente a criação da urna eletrônica. Todos foram esforços feitos às vezes por intermédio de decisões do Congresso, às vezes do Judiciário, no intuito de tornar eleições mais legítimas e mais limpas. A mecânica de votação, que parece pouco hoje, mas não é pouco. As eleições até recentemente eram razoavelmente adulteradas. Vota-se morto, que estava fora do cadastro, adulterava-se o resultado das eleições manipulando boletins de urnas."
Num esforço para garantir cada vez mais a lisura e a eficiência do processo, a Justiça eleitoral amplia nestas eleições de outubro o número de brasileiros identificados pelas digitais. Serão 21 milhões de eleitores de 770 cidades de todos os estados e do Distrito Federal.
Entre os municípios, 15 capitais irão utilizar o sistema biométrico, que começou a ser testado em 2008. Nas últimas eleições gerais, em 2010, mais de um milhão de eleitores de 60 municípios de 23 estados usaram a digital para se identificar. A meta é que, até 2018, o sistema biométrico esteja presente em 100% dos municípios nas eleições.