como o passado da escravidão influencia no racismo?
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Dezenas de anos depois, o fosso entre brancos e negros persiste em todos os cantos. No mês em que se completam 130 anos da Lei Áurea, de 13 de maio de 1888, as iniquidades a que a população negra brasileira está agrilhoada se revelam sem meias palavras: ela tem menor escolaridade, apresenta taxas de analfabetismo duas vezes superiores ao registrado entre o restante dos habitantes, tem os menores salários, é a mais afetada pelo desemprego, tem menor acesso ao sistema de saúde e é a que morre mais cedo. Apesar de serem mais da metade da população brasileira (53,6%), negros e negras são 76% dos 10% mais pobres, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Expressão maior de um prejuízo sistemático, sustentado em três séculos de escravidão, a epidemia de homicídios, por exemplo, atinge em maior proporção a população negra: são 56 mil pessoas assassinadas todos os anos, o que equivale a 29 vítimas por cem mil habitantes, índice considerado epidêmico pela Organização das Nações Unidas (ONU). Desse total, 53% são jovens e, destes, 77% são negros e 93% do sexo masculino, reproduzindo e aprofundando as desigualdades sociais. Isso significa, segundo a ONU, cinco jovens negros mortos a cada duas horas no país, totalizando 23 mil jovens negros mortos por ano. As estatísticas foram apresentadas pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Senado sobre Assassinato de Jovens, realizada em 2016, revelando também que mais de 80% dos casos de assassinatos de adolescentes e jovens negros foram por arma de fogo.
Segundo o Atlas da Violência de 2017, elaborado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o quadro é pior, caracterizando um genocídio de jovens negros: a cada cem pessoas
assassinadas no Brasil, 71 são negras, sendo a taxa de homicídio entre adolescentes pretos e pardos quase quatro vezes maior do que entre os brancos (36,9 a cada 100 mil habitantes, contra 9,6). A população negra, de acordo com o levantamento, corresponde à maioria (78,9%) dos 10% dos indivíduos com mais chances de serem vítimas de homicídios, com risco 23,5% maior de ser assassinada em relação a brasileiros de outras raças, já descontado o efeito da idade, escolaridade, do sexo, estado civil e bairro de residência.
O mesmo é desvelado quando se observa o feminicídio. O Mapa da Violência 2015, que estudou a dinâmica dos homicídios femininos nos últimos anos, elaborado pela Faculdade Latino-Americana de Estudos Sociais (Flacso), confirma que o feminicídio também tem cor, e ela é negra. Segundo o levantamento, entre 2003 e 2013, o número de mulheres negras assassinadas por sua condição de gênero feminino cresceu 54%, ao passo que o índice de feminicídios de brancas caiu 9,8% no mesmo período. O mesmo revela a pesquisa ‘Violência contra a mulher: feminicídios no Brasil’, do Ipea, divulgada em 2013: em todo o país, 61% dos feminicídios foram de mulheres negras, com destaque para a elevada proporção de óbitos de negras nas regiões Nordeste (87%), Norte (83%) e Centro-Oeste (68%). De acordo com o Ipea, a maior parte das vítimas apresentava baixa escolaridade, 48% daquelas com 15 ou mais anos de idade tinham até oito anos de estudo.
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