cite os principais fatores para a sua decadencia na Europa?
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Há motivos para aceitar como algo inevitável que a Europa não recuperará das tensões provocadas pela crise e pelo extenso sentimento de que estamos no fim de um ciclo que deslocará em definitivo a centralidade do mundo para a Ásia e o Pacífico. Mas isso não vai ocorrer da maneira imediata. Arnold Toynbee estabeleceu a teoria cíclica das civilizações que nascem e morrem em companhia dos séculos que as vão sepultando. Mas as correntes de fundo que movem as culturas e os impérios não param abruptamente.
Faz agora cem anos, em vésperas da Grande Guerra, Oswald Spengler concluiu a sua obra "A decadência do Ocidente", na qual expunha que as civilizações tinham ciclos de vida naturais e que o mundo ocidental havia chegado ao seu ocaso. Nas sociedades abertas e livres, a tendência para enegrecer o futuro é um recurso frequente que conduz ao pessimismo e a situações de medo colectivo. Já se sabe que o medo não é sobre o que vivemos ou sofremos, mas sobre as incertezas que os nossos presságios projectam. No Ocidente em geral, e na Europa em particular, onde o nível de vida continua a ser muito superior ao da média, parece que entrámos já, por antecipação, nesse espaço de grande sofrimento que pressagiamos. Mas o futuro reiventa-se permanentemente e todas as previsões para uma tão grande escala de tempo, espaço, economia, população, etc, são precipitadas.
O século XX começou com a Belle Époque, que significava progresso, ciência e «o fardo do homem branco», que era, segundo Kipling, o autor da expressão, civilizar as sociedades colonizadas da África e Ásia. Começou com grande euforia e penetrou nas trevas das duas guerras mais ferozes e sanguinárias que a Europa conheceu, e acabou com o período mais longo de convivência, paz e bem-estar que viveu a velha civilização europeia, sempre tão a ponto de ficar sepultada nos sarcófagos da história.
A crise da Europa não se deve, a meu ver, a na Ásia se produzir mais e mais barato, mas ao facto de nos termos deixado levar pela euforia do crescimento sem esforço, por termos trocado a cultura da poupança pela do crédito, por termos uma cultura pouco liberal na economia e demasiado liberal socialmente, permitindo milhões de excluídos que dificilmente poderão regressar a esse amplo espaço em regressão que conhecemos como classe média. E se este último ponto se deve à falta de visão da direita, os restantes foram mais ou menos conscientemente alimentados pela esquerda, que favorece o consumismo desmedido (a ideia tonta de que pode haver tudo para todos) e continua sem reconhecer que quem vive de crédito, seja família, empresa ou estado, vive acima das suas possibilidades e, mais cedo ou mais tarde, acaba em maus lençóis.
Mas a decadência não é meramente económica ou geoestratégica: é também civilizacional. Deixámos crescer um sistema enquistado nos aspectos menos humanistas e mais egoístas, em que se pratica um darwinismo guiado pelos mercados e as finanças. E se isto é, evidentemente, um pecado de direita, também não vi a esquerda empenhar-se no seu combate. Aliás, vivem tão fascinados pela tecnologia e pelo novo meio de propaganda/luta que são as redes sociais, que nem se apercebem de que aqueles e estas contribuem decisivamente não só para o egoísmo, mas para um encerramento em torno de si.
A Europa pode e deve rebater esta sensação de derrota. Para isso a política deve voltar a ser o instrumento mais idóneo para servir os interesses dos cidadãos. Não pode ficar impune a corrupção, que é a principal causa das desigualdades. Há que desterrar as utopias que sempre que postas em prática deram resultados catastróficos. E desconfiar dos salvadores da pátria. A decadência, em qualquer caso, não está na política, mas nas condutas daqueles que a gerem. É certo que o sistema se deteriorou, mas é reparável. A grande incógnita é se esta regeneração se poderá fazer sem confrontações violentas, como ocorreu no passado.