Capítulo XI
Prudêncio, um moleque de casa, era o meu cavalo de todos os dias; punha as mãos no chão, recebia um cordel nos queixos, à guisa de freio, eu trepava-lhe ao dorso, com uma varinha na mão, fustigava-o, dava mil voltas a um e outro lado, e ele obedecia – algumas vezes gemendo –, mas obedecia sem dizer palavra, ou, quando muito, um “ai, nhonhô!” – ao que eu retorquia: – “Cala a boca, besta!”
Capítulo LXVIII
Era um preto que vergalhava outro na praça. O outro não se atrevia a fugir; gemia somente estas únicas palavras: “- Não, perdão meu senhor; meu senhor, perdão!" Mas o primeiro não fazia caso, e, a cada súplica, respondia com uma vergalhada nova. (...) “- Cala a boca, besta!”, replicava o vergalho (...) Quem havia de ser o do vergalho? Nada menos que o meu moleque Prudêncio, – o que meu pai libertara alguns anos antes. (...) Era um modo que o Prudêncio tinha de se desfazer das pancadas recebidas, – transmitindo-as a outro. Eu, em criança, montava-o, punha-lhe freio na boca, e desancava-o sem compaixão; ele gemia e sofria. (...) Agora, porém, que era livre, (...) comprou um escravo, e ia-lhe pagando, com alto juro, as quantias que de mim recebera. Vejam as sutilezas do maroto!
ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Editora Globo, 2008. (fragmentos)
Estes trechos de Machado de Assis estão atrelados ao contexto do fim do século XIX. Nesse contexto, mudanças sociais e políticas estavam ocorrendo no Brasil, e uma dessas mudanças refere-se ao quadro do escravismo. Nesses trechos o autor destaca
(A) a mudança na mentalidade da sociedade da época, que vislumbrava um modelo social e político pautado na liberdade de todos.
(B) a não aceitação da escravidão pelo negro no Brasil, que também demonstrava seu poder quando se tornava livre.
(C) a ironia do sistema escravista no Brasil, marcado pela retroalimentação, na qual o escravo alforriado tornava-se dono de seu próprio escravo.
(D) a conscientização, por parte do senhor branco, da condição de humilhação e degradação do negro no Brasil.
(E) a indignação da população da época em relação aos castigos físicos sofridos pelos negros em lugares públicos.
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Soluções para a tarefa
A alternativa correta é a letra: C
Pois o trecho 2 revela que o menino escravo que o narrador relata que servia como um cavalo, mais tarde, após ter conseguido a alforria, passou também a ser proprietário de escravos, o que mostra que o sistema escravista possuía a particularidade de se retroalimentar, situação que revela um paradoxo irônico.
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(C) a ironia do sistema escravista no Brasil, marcado pela retroalimentação, na qual o escravo alforriado tornava-se dono de seu próprio escravo.
Os trechos do texto de autoria de Machado de Assis estão relacionados ao contexto encontrado no final do século XIX, em que diversas mudanças sociais e políticas ocorriam no Brasil, como por exemplo, o escravismo.
No trecho 2, descreve-se que o menino escravo servia como um cavalo, e que mais tarde, após ter sua alforria, também se torna um proprietário de escravos. Tal fato mostra que o sistema escravista apresentava a particularidade de retroalimentação, resultando em um paradoxo irônico.
Bons estudos!