Bruno Astuto: Os reencontros em tempos de coronavírus
Minha amiga nem se lembrava mais de como era ter um sábado em paz, sabendo que o filho
estava no quarto ao lado, assistindo a uma maratona de séries
15/03/2020
Pensei em escrever nesta semana sobre a nova etiqueta em tempos de coronavírus.
Sabe como é, nós, brasileiros, latinos e afetuosos (eu), temos um pouco de dificuldade em
cumprimentar as pessoas sem toques. O tal do cumprimento por cotovelada, esse não aceito de
jeito nenhum. E o “coronakiss”, que inventaram na semana de moda de Paris, aquele em que se
trocam dois beijinhos no ar, lembra-me as peruas ultramaquiadas em chazinho da tarde. Tô fora.
De todas as soluções, simpatizei com a que foi proposta pelo primeiro-ministro de Israel,
Benjamin Netanyahu, que sugeriu um “namastê” de palmas abertas uma contra a outra com
uma leve inclinada de cabeça. Um gesto que lembra a placidez dos budistas, xintoístas e
hindus, e essa serenidade é tudo de que precisamos numa hora como esta.
Daí me liga uma amiga contando que o filho adolescente pegou o coronavírus. O teste
dela deu negativo, mas o fato de ter convivido com ele a obrigou a ficar também em casa. A
situação é, por si só, esdrúxula: o garoto fica isolado no quarto, mas precisa se alimentar. Ela
leva a bandejinha, usando luvas e máscaras.
Dez dias dessa rotina já se passaram e, segundo ela, as emoções foram mistas. Primeiro
a preocupação com seu filhote, que, felizmente, só teve uma baixa febre constante e muita
tosse. Depois, com uma culpa prazerosa, ela confessou que, pela primeira vez em não sabe
quanto tempo, teve de volta seu bebê apenas para si. O dia todo. E, principalmente, a noite
toda. Nem se lembrava mais de como era ter um sábado em paz, sabendo que o filho estava no
quarto ao lado, assistindo a uma maratona de séries — e não nessas nights sem lhe dar a única
coisa de que toda mãe precisa, além de água e oxigênio: que ele telefone a cada cinco minutos
para dizer que está vivo.
E, já que ele estava disponível, que tal tentar resgatar um pouco de cumplicidade? Sua
vida profissional é atribuladíssima, e a do rapaz, além da escola e dos trocentos amigos e
namoradas, idem. Ele é um bom garoto, mas não muito de se abrir. Ela é uma boa mãe, mas
uma mulher exausta — quantas vezes não se pegou agradecendo ao santo Steve Jobs a
invenção do iPhone, esse, sim, o melhor amigo do filho. Mas sempre fingiu que ia confiscar o
aparelho, caso ele não o largasse nas poucas refeições que faziam juntos.
Nas primeiras tentativas de estabelecer um contato mais profundo, ela conta que sentiu
um grande incômodo: é como se estivesse sendo reapresentada àquele ser que colocou no
mundo. Mas, aos poucos, foi descobrindo o homem que ela julgava ter mal educado. Por
exemplo: que ele achava que a casa andava produzindo lixo demais, que o planeta não
suportaria tamanho desperdício, por isso ele estava cogitando fazer faculdade de engenharia
ambiental. Que tem uma menina na escola em que ele está interessado, mas não sabe como
abordá-la, porque não quer que ela se sinta desconfortável — o que fazer? Ali ela viu que criou
um cara legal. E que, por trás dele, havia também uma mãe legal. Perdoou-se
pergunta
Transcreva, do texto, um trecho em que esteja explícito o diálogo com o leitor.
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Resposta:"que tal tentar resgatar um pouco de cumplicidade?"
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