Bem, aí é que estava o problema, tantas foram as ideias que me vieram ao mesmo tempo. Uma, por exemplo, que foi sempre um grande sonho meu: ficar invisível. Mas, pensando bem, para que eu queria ficar invisível? Que vantagem havia no fato de ser visto pelos outros? A única que me ocorreu foi a de entrar no cinema sem pagar. Mas corria o risco de alguém se sentar em cima de mim, pensando que a poltrona estivesse vazia.
Em todo caso, fui ao espelho e falei para a minha imagem:
– Fique invisível!
O susto da minha vida: na mesma hora vi a minha roupa vazia, flutuando no ar, os meus sapatos se mexendo sozinhos, as calças sem minhas pernas dentro, as mangas da blusa sem braços, a gola sem pescoço e eu sem cabeça. Era mesmo para assustar qualquer um! Já ia tirar a roupa toda para que desaparecesse até a forma do meu corpo, mas achei mais prático fazer a roupa se tornar invisível também. Não seria nada engraçado se tivesse de voltar a ficar visível e aparecesse pelado na vista de todo mundo.
Senti uma grande aflição quando não vi mais nada diante do espelho. Tive que me apalpar para saber que ainda estava ali.
Saí do quarto e fui ver o que acontecia. Passei pela minha mãe na sala e ela olhou através de mim como se eu não existisse. Não resisti e chamei-a:
– Mamãe…
Ela olhou em direção à minha voz:
– Fernando? Onde é que você está?
– Aqui… – e fui me colocar às suas costas.
Ela se voltou na cadeira:
– Aqui onde? Por que você está se escondendo?
Ao ouvir de novo a minha voz, vinda agora de outra direção, ela se levantou, desnorteada, deu uma volta completa com o corpo, inspecionando a sala inteira. Depois se curvou para olhar debaixo da mesa:
– Onde é que se meteu esse menino, minha Nossa Senhora.
Embarafustei-me rindo pelo corredor adentro, fui até a cozinha. Dei com a Alzira de costas para mim, diante do fogão. Fiquei rente dela, e comecei a destampar as panelas, para ver o que tinha dentro. Nem cheguei a ver: ela soltou um berro e pulou para trás, ao dar com as tampas se erguendo no ar. Então peguei numa panela pelo cabo e a levei até a mesinha ao lado da pia. Ela acompanhou com os olhos arregalados a panela no ar, botou a boca no mundo:
– Te esconjuro! Virgem Santíssima, tem dó de mim! Essa casa tá mal assombrada!
E disparou em direção a porta dos fundos, levando um trambolhão ao esbarrar de cheio em mim:
– Ui, que é isso? Ai, meu santo, tem demônio aqui pra todo lado!
Num segundo ela despencava escada abaixo, indo se refugiar no meu quarto. Refeito do susto que levei eu próprio, quando ela quase me atirou no chão, fui atrás. Por pouco não atropelo a Fernanda, que estava no meio do quintal, e não se afastou para me dar passagem. Pela janelinha do barracão vi a cozinheira ajoelhada no chão diante de um santinho pregado na parede, fazendo o nome-do-padre, um atrás do outro.
Antes de reaparecer, resolvi ainda passar um susto no Godofredo. Cheguei bem pertinho do poleiro e o papagaio ficou com aquele olhar parado assustando o ar, como se tivesse ouvido algum barulhinho. Quando ia cutucá-lo com o dedo, para derrubá-lo do poleiro, o miserável virou rápido a cabeça e me deu uma bicada na mão. Quem se assustou fui eu:
– Desgraçado, você me paga por essa papagaiada.
Chegou a sair sangue. Como é que ele teria me visto?
Só quando voltei ao meu quarto, antes de me tornar visível, é que reparei que o dedo ficou sujo de fuligem quando mexi nas panelas.
Fernando Sabino
ESTUDO DO TEXTO
1- Qual era o grande sonho do narrador?
A) Era tornar-se um engenheiro.
B) Era tornar-se um mágico.
C) Era tornar-se invisível.
D) Era tornar-se um professor.
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Acho que é a d
Espero ter ajudado
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