bales de repertório século XIX
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Quando pensamos em ballet é comum lembrarmos de obras como O Lago dos Cisnes, Giselle, O Quebra-Nozes, A Bela Adormecida e Dom Quixote, não é mesmo? Além de serem considerados clássicos e estarem no imaginário coletivo mundial, estes espetáculos têm em comum o fato de pertencerem a uma mesma categoria: a do ballet de repertório.
Criado na corte francesa do rei Luís V pelo coreógrafo Jean George Noverre, o ballet de repertório (em francês ballet d’action) revolucionou a modalidade artística, que na época estava perdendo espaço para danças consideradas mais populares.
Noverre eliminou as tradicionais máscaras e perucas e a prática de declamação de poesias (muito comum nos primeiros anos do ballet clássico), dividiu os espetáculos em cenas e atos e investiu na precisão dos movimentos e na interpretação dramática dos bailarinos com o objetivo de contar uma história para o público por meio da dança.
As temáticas também foram alteradas: no lugar de deuses e seres mitológicos, os espetáculos passaram a contar histórias de pessoas comuns, mais próximas da realidade dos moradores da corte. O primeiro ballet de repertório da história, La Fille Mal Gardée (ou A Filha Malcriada), é um exemplo claro dessa mudança de repertório. A obra, encenada pela primeira vez em 1789, conta a história de uma rica viúva que luta para manter sua propriedade e impedir que a filha seja enganada por pessoas interessadas em sua herança.
Apesar de ter sido idealizada no século XVIII, foi no século XIX que essa modalidade do ballet ganhou força, principalmente a partir do Romantismo. Além de se manterem focados na dança acadêmica desenvolvida por Noverre, os espetáculos passaram a contar histórias leves de seres mágicos, como fadas e bruxas, ou inspiradas na visão dos europeus sobre a cultura do Novo Mundo – África, Ásia e Oriente Médio, geralmente tendo os não-europeus como vilões.
La Sylphide é considerada a primeira grande obra neste formato. Apresentado pela primeira vez em 1832 na Ópera de Paris, o espetáculo conta a história de um escocês que se apaixona por uma sílfide, espécie de fada na mitologia grega, e, por conta desse amor, vivencia uma série de desventuras. Além de modernizar a temática, La Sylphide também inovou no figurino ao introduzir os tutus românticos e as sapatilhas de ponta (utilizadas pela protagonista, interpretada pela bailarina Marie Taglioni), elementos que se tornaram grandes símbolos do ballet.
Alguns anos depois, em 1841, é lançado Giselle, um dos mais famosos ballet de repertório, considerado até hoje o ballet mais desafiador para qualquer bailarina e que tem como base histórica o embate entre os mundos físico e o espiritual.
Neste período, o ballet entra em declínio na França, mas encontra espaço para renovar em técnica e criatividade na Rússia.Em 1862, Marius Petipa, primeiro bailarino do Ballet Imperial Russo, cria A Filha do Faraó, uma fantasia com cobras venenosas e múmias que arrebata o coração do público. Sete anos mais tarde, o mesmo Petipa estreia Dom Quixote, baseado na obra do espanhol Miguel de Cervantes, e, em 1877, sua primeira versão de O Lago dos Cisnes, com música de Piotr Tchaikovsky, cuja versão final só seria apresentada ao público em 1895. A parceria entre Petipa e Tchaikovsky ainda renderia outras duas grandes obras do ballet de repertório: A Bela Adormecida, em 1890, e O Quebra-Nozes, em 1892, inspirado na obra The Nutcracker and the Mouse King, de Ernst Theodor Amadeus Hoffman.
Com elementos muito bem definidos – figurino (tules e sapatilhas de ponta), cenários grandiosos, música, divisão dos espetáculos por cenas e atos, corpo de baile (para as coreografias em grupo), solistas (para dar vida aos personagens principais) – e contando histórias que mesclam o mundo real com o universo da fantasia, estas obras sobreviveram à passagem dos anos.
Remontados até os dias de hoje pelas principais companhias de ballet do mundo com as mesmas músicas, coreografias (com adaptações, em alguns casos, sempre informadas ao público) e elementos, estes espetáculos continuam a encantar públicos das mais diversas gerações e representam a mais pura e sublime essência da arte do ballet.