História, perguntado por 16ssouza161, 9 meses atrás

Apresente as duas visões sobre o Movimento do Cangaço, construídas pelas diferentes narrativas
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Respondido por andreiadomonteesilva
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Resposta:

É sempre uma surpresa positiva encontrar um livro de pesquisa social que exercite a dúvida. Uma obra que exponha tanto as evidências que levaram o autor a chegar a determinada conclusão como aquelas que poderiam fazer com que o leitor delas suspeitasse. Temos então a promessa de um diálogo de honestidade intelectual. Isso se alcança, num primeiro momento, pelo descarte das grandes teorias explicativas em favor de um recorte mais indutivo, o que por sua vez pode implicar uma falta de ambição teórica. Esse é sempre o dilema da explicação na ciência social: comprovar a tese ou teorizar sobre a prova. A interpretação apresenta-se nessas horas como alternativa. O autor interpela os fatos não para retomar na conclusão a hipótese adiantada no primeiro capítulo, mas o faz no decorrer da exposição à luz de grandes questões teóricas, buscando dosar profundidade e representatividade.

É uma missão arriscada que requer muita capacidade argumentativa. Se à criatividade necessária para realizar esse projeto não corresponder uma pesquisa original diligente, a obra será enquadrada entre os textos de sistematização. Se o autor ostenta grandes descobertas factuais, porém faz perguntas ingênuas, o livro gravita para um mercado em que o sucesso de público depende tanto ou mais da qualidade literária do que do interesse teórico.

Interpretação original

Em Os Cangaceiros – Ensaio de Interpretação Histórica, Luiz Bernardo Pericás aborda o fenômeno mais conhecido da história popular do Nordeste do Brasil, e um dos mais discutidos na historiografia nacional, decidido a correr o risco de trilhar esse caminho ambicioso, e o faz com muito sucesso. Preparou sua pesquisa pensando fora do convencional. Antes de viajar pelo semiárido, passou um ano na Universidade do Texas, em Austin, na maior das bibliotecas de estudos latino-americanos dos EUA, incorporando fontes descartadas ou ignoradas até então por especialistas da área. Seu amplo espectro de interesses intelectuais o fez escrever um livro em que explora a relação do cangaço com o movimento operário, a questão “racial”, confronta-o com as teorias do banditismo social, os misticismos religiosos, analisa seus personagens e estrutura de organização tendo por pano de fundo as características dominantes da sociedade rural nordestina de então: a persistência de estruturas oligárquicas e a violência do cotidiano.

Muitos podem não concordar com suas teses originais, mas é difícil que alguém as considere ousadas demais em face da riqueza de fatos apresentada. Entre suas melhores passagens, o livro propõe que a forma de guerrear do cangaceiro foi produto do amadurecimento secular da experiência de negros rebelados, caboclos oprimidos, e da crueldade do senhorio moreno do Nordeste, vencendo assim a tentação de explicar a luta entre as forças da ordem e do banditismo alinhando-as em termos de classe ou cultura. Em todos os momentos, a análise revela maturidade ao não se deixar seduzir pela dimensão épica do cangaço e traçar um panorama complexo das mentalidades de seus integrantes, em que as vontades de riqueza, poder e gozo se misturam ao desejo de justiça coletiva e redenção.

Trata-se da obra mais sofisticada até o momento de um historiador jovem, inquieto, e de certo modo outsider. Pericás construiu uma já prolífica carreira (mais de 50 artigos acadêmicos publicados, dez livros, sendo dois de ficção, e outros tantos organizados e prefaciados) tangenciando os departamentos universitários, evitando associar-se a esta ou àquela corrente de pensamento. Tal desprendimento seguramente é uma das razões para o frescor deste livro.

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