a revolução dos coelhos
Soluções para a tarefa
Peter Sloterdijk chama de “Internacional Miserabilista” um grande movimento intelectual e moral não orquestrado que vê a Terra e o homem como limitados, como vítimas de uma eterna ameaça de escassez como uma condição natural.
Na maior parte das ficções dos adeptos da Internacional Miserabilista, dado que o mundo e o homem são elementos da miséria e voltados não para o viver e sim para o sobreviver, toda e qualquer catástrofe leva a mais catástrofe. Se a crise atinge um lugar, todos comem seus animais e, depois, seus inimigos, os parentes e a si mesmos. A Internacional Miserabilista tem poder. Domina certa antropologia e faz sucesso no cinema. Os seus adeptos adoram dizer que são realistas. Mas o realismo, no meu entender, nada é senão uma versão literária ou filosófica do banditismo. O realista pouco vê do real. Denigre a natureza humana se pondo como um pessimista, dado que o pessimismo é uma forma de alguns se mostrarem inteligentes.
A Internacional Miserabilista tem adeptos na direita e na esquerda. O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, é um seu adepto. Por isso mesmo, distribuiu coelhos para serem comidos pela população da Venezuela, já que o país está em crise geral de abastecimento. Há fome na Venezuela, até para quem tem dinheiro. Os coelhos, inclusive pelo fato de se reproduzirem rápido, deveriam então funcionar como a saída para a tal “baixa de consumo de proteína” do povo venezuelano no momento.
Maduro ficou estarrecido com a sua genialidade. Com coelhos derrotaria “o imperialismo ianque que está sufocando Cuba, a Venezuela e a Coreia do Norte” – expressão esta que é uma adaptação que o ex-motorista de ônibus tem de alguma coisa que ele ouviu de Chávez, e que este ouviu de Fidel. Tudo isso no tempo que ouvir Fidel era ainda alguma prática, quando nem coelhos habitavam a Terra, mas sim dinossauros. Todavia, o problema é que o mundo não funciona como a Internacional Miserabilista quer e muitos menos como o realismo nos descreve. E eis que a população da Venezuela resolveu não comer os coelhos, mas adotá-los. Virou febre na Venezuela a proteção aos coelhos. As pessoas estão dormindo com os coelhos.
Não estou dizendo que não haverá aqui e ali alguém que não mate um bichinho desses para comer. Pessoas que optam pela morte existem em todo lugar. Mas o interessante é que a política de abastecimento de Maduro, na base do coelho e da ideia de que a morte dos animais resolve a vida dos humanos, não vingou. A política da salvação pela proteína, vingou menos ainda. Os venezuelanos trouxeram para junto de casa os coelhos, e agora fazem seus cães e gatos se acostumarem com os bichinhos, ou simplesmente os protegem mesmo, andando com eles no colo pelas cidades.
Os coelhos se tornaram não-bolivarianos e talvez sejam recolhidos como “contra-revolucionários”. Se a população deixar, é claro. O gênio incompreendido, Maduro, fabricou mais um problema para ele mesmo.