2)Qual a diferença entre um texto sagrado escrito e um oral?exemplifique cada espécie
Soluções para a tarefa
Não existe ‘o oral’, mas ‘os orais’ sob múltiplas formas, que, por outro
lado, entram em relação com os escritos, de maneiras muito diversas: podem
se aproximar da escrita e mesmo dela depender – como é o caso da
exposição oral ou, ainda mais, do teatro e da leitura para os outros –,
como também podem estar mais distanciados – como nos debates ou, é
claro, na conversação cotidiana. Não existe uma essência mítica do oral
que permitiria fundar sua didática, mas práticas de linguagem muito
diferenciadas, que se dão, prioritariamente, pelo uso da palavra (falada),
*
Schneuwly é apresentado como co-autor deste texto por ser o autor da conferência nele analisada e, principalmente,
por ser, em grande parte, autor da visão sobre as relações entre oralidade e escrita que nele é adotada. A análise
em si da conferência, entretanto, é da autoria de Rojo, e os eventuais equívocos e imprecisões nela encontrados
são de sua exclusiva responsabilidade.
** Professora do Departamento de Lingüística Aplicada do Instituto de Estudos da Linguagem (IEL), UNICAMP.
Doutora em Lingüística Aplicada.
*** Professor titular da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação (FAPSE) da Universidade de Genebra (UNIGE),
Suíça. Doutor em Ciências da Educação.
464 Linguagem em (Dis)curso - LemD, Tubarão, v. 6, n. 3, p. 463-493, set./dez. 2006
As relações oral/escrita nos gêneros orais formais e públicos ...
mas também por meio da escrita, e são essas práticas que podem se tornar
objetos de um trabalho escolar. (SCHNEUWLY, 2004, p. 135)
Muito se tem discutido, nos anos recentes, sobre as relações que se
estabelecem entre as modalidades oral e escrita no uso da língua1
. As décadas de 70
e 80 testemunharam uma abordagem dicotômica dos dois fenômenos, que buscava
e, por vezes, mistificava, semelhanças e diferenças de um oral tido como puro e de
uma escrita tão transparente e pura quanto.
O quadro 1, montado a partir das discussões presentes em Marcuschi (2001a,
p. 27-31), mostra as qualidades tidas como privativas de uma ou de outra modalidade,
nos anos 802
:
Quadro 1 – A perspectiva dicotômica das modalidades e de seu contexto de uso.
Ou seja, via-se a fala como desorganizada, variável, heterogênea e a escrita
como lógica, racional, estável, homogênea; a fala seria não-planejada e a escrita,
planejada e permanente; a fala seria o espaço do erro e a escrita, o da regra e da
norma, enquanto a escrita serviria para comunicar à distância no tempo e no espaço;
a fala somente aconteceria face a face; a escrita se inscreveria, a fala seria fugaz; a
fala é expressão unicamente sonora; a escrita, unicamente gráfica.
1
Ver, a respeito, a coletânea organizada por Signorini em 2001.
2
Ver a respeito os trabalhos de Bernstein (1971), Labov (1972), Goody (1977), Olson (1977), Ochs (1979), Scribner
e Cole (1981), Ong (1982), Tannen (1982), Halliday (1985), Lahire (1993) e Scribner (1997), por exemplo.
Resposta:
Linguagem em (Dis)curso - LemD, Tubarão, v. 6, n. 3, p. 463-493, set./dez. 2006 485
Rojo e Schneuwly
A tendência analítica do discurso indireto manifesta-se principalmente pelo
fato de que os elementos emocionais e afetivos do discurso não são
literalmente transpostos ao discurso indireto, na medida em que não são
expressos no conteúdo mas nas formas da enunciação. [...] As abreviações,
elipses, etc., possíveis no discurso direto por motivos emocionais e afetivos,
não são admissíveis no discurso indireto por causa da sua tendência analítica.
Esses elementos só entram na sua construção sob uma forma completa e
elaborada.
No caso da variante analisadora de conteúdo do estilo linear, o discurso do
outro é apreendido como “uma tomada de posição com conteúdo semântico preciso
por parte do falante”, e busca-se transpor ou retextualizar de maneira analítica sua
composição objetiva exata (o que disse o falante). Para Bakhtin/Volochínov (1929,
p. 167),
A tendência a tematizar o discurso de outrem é incontestavelmente inerente
a essa variante, e assim ela preserva a integridade e a autonomia da
enunciação, não tanto em termos sintáticos mas em termos semânticos
(vimos como uma construção expressiva numa enunciação a ser citada
pode ser tematizada). Esses resultados, contudo, só são obtidos ao preço
de uma certa despersonalização do discurso citado.
Para o autor, isso é típico de certos contextos e esferas de atividade humanos,
que ele qualifica como “um contexto enunciador suficientemente racional e
dogmático”, em que se manifesta um “forte interesse pelo conteúdo semântico, e
onde o autor afirma, através de suas próprias palavras, com sua própria
personalidade28, uma posição de forte conteúdo semântico”.
Portanto, as apreciações de valor que levam o transcritor a retextualizar e
modificar um texto oral original são fortemente ligadas à propriedade da palavra, a
monumentalidade da palavra e disso decorre uma tendência a preservação do conteúdo.
São, no entanto, tendências diversas de “apreensão ativa” do discurso alheio