sobre o livro cortiço:
Não obstante, as casinhas do cortiço, à proporção que se atamancavam, enchiam-se logo, sem mesmo dar tempo a que as tintas secassem. Havia grande avidez em alugá-las; aquele era o melhor ponto do bairro para a gente do trabalho. Os empregados da pedreira preferiam todos morar lá, porque ficavam a dois passos da obrigação. [...] Noventa e cinco casinhas comportou a imensa estalagem. [...] As casinhas eram alugadas por mês e as tinas, por dia; tudo pago adiantado. O preço de cada tina, metendo a água, quinhentos réis; sabão à parte. As moradoras do cortiço tinham preferência e não pagavam nada para lavar. [...] E, mal vagava uma das casinhas, ou um quarto, um canto onde coubesse um colchão, surgia uma nuvem de pretendentes a disputá-los. [...] E naquela terra encharcada e fumegante, naquela umidade quente e lodosa, começou a minhocar, a esfervilhar, a crescer, um mundo, uma coisa viva, uma geração, que parecia brotar espontânea, ali mesmo, daquele lameiro, e multiplicar-se como larvas no esterco. [...] Durante dois anos o cortiço prosperou de dia para dia, ganhando forças, socando-se de gente. [...] Daí a pouco, em volta das bicas era um zum-zum crescente; uma aglomeração tumultuosa de machos e fêmeas. Uns, após outros, lavavam a cara, incomodamente, debaixo do fio de água que escorria da altura de uns cinco palmos. O chão inundava-se. As mulheres precisavam já prender as saias entre as coxas para não as molhar; via-se-lhes a tostada nudez dos braços e do pescoço, que elas despiam, suspendendo o cabelo todo para o alto do casco; os homens, esses não se preocupavam em não molhar o pelo, ao contrário, metiam a cabeça bem debaixo da água e esfregavam com força as ventas e as barbas, fossando e fungando contra as palmas da mão. As portas das latrinas não descansavam, era um abrir e fechar de cada instante, um entrar e sair sem tréguas. Não se demoravam lá dentro e vinham ainda amarrando as calças ou as saias; as crianças não se davam ao trabalho de lá ir, despachavam-se ali mesmo, no capinzal dos fundos, por detrás da estalagem ou no recanto das hortas.
AZEVEDO, Aluísio. São Paulo: Saraiva, 2008 (Clássicos Saraiva).
O AGLOMERADO HUMANO DO CORTIÇO DE JOÃO ROMÃO
a)O fragmento citado trata da construção e do povoamento do cortiço São Romão, espaço central do romance de Aluísio Azevedo. A partir da leitura do texto, responda às questões propostas a seguir.
b)Como pode ser caracterizado o espaço do cortiço, a partir dos procedimentos empregados no processo de sua construção?
c)De que forma foi sendo realizado o povoamento do cortiço?
d)Como é descrita a população do cortiço? Em que medida essa descrição se aproxima das características do movimento naturalista?
e)Que relações os habitantes do cortiço mantêm com o espaço em que vivem?
De que modo vai se constituindo o cotidiano da vida no cortiço? Responda utilizando passagens do texto.
Soluções para a tarefa
Resposta:
B) Tendo em vista sua construção, o espaço do cortiço, presente no fragmento, se mostra como um amontoado de residências, propícias a serem alugadas pela classe trabalhadora. Como característica própria do naturalismo, o texto apresenta um ambiente animalesco ao descrever as condições de vida do cortiço, traçando um paralelo entre o homem e a animalesca realidade despersonalizando os indivíduos que ali vivem:"E naquela terra encharcado e fumegante, naquela úmida e quente lodosa, começou a minhocar, a esfervilhar, a crescer um mundo, uma coisa viva, uma geração, que parecia ali brotar espontaneamente" note que neste trecho os indivíduos são despersonalizados como seres humanos, passam a ser tratados como seres animalescos estagnados em sua própria condição.
C) O povoamento foi espontâneo como relato o texto, dada as condições de vida e a realidade imposta, a grande demanda por um local próximo do trabalho ou de um bom custo-benefício foram procurados, apresentando-se como fatores decisivos.
D) Os habitantes do cortiço, no presente fragmento, se caracterizam aos moldes do movimento naturalista ao apresentarem temas como o sensualismo presente em:"As mulheres precisavam prender as saias entre as coxas para não as molhar; via-se-lhes a tostada nudez dos braços e do pescoço, que elas despiam", a miséria ao retratar as condições de vida de seus morados, a sofrência ao relacionar seu íntimo a própria miséria, assuntos estes recorrentes a narrativa naturalista.
E) Acredito que seja uma relação de dependência psicológica, veja bem, eles se encontram em um estado de estagnação social, emocional e financeira, a medida em que sua condição os levou a este lugar a que chamam de ler, estes indivíduos se vêem mesmo que indiretamente presos a ele como que a si próprios. É uma relação de imutabilidade.
F)
(Deixarei a última em branco. Peço desculpa por isso!)
Espero ter ajudado. ^^