O homem desperdiçado
Roma já entrou em horário de verão, minha filha que mora lá esqueceu o fuso do Rio e me
telefona com uma hora de antecedência. Acordo mais cedo, os jornais nem chegaram ainda, a
empregada me serve o café e vou à varanda olhar o dia que nasce sobre a Lagoa.
Quando havia Mila e Títi, era uma festa sair com elas, o ar gostoso ainda molhado pela noite
entrando em ossos focinhos. Os olhinhos delas brilhavam, eu era feliz e sabia.
Meu mundo ficou menor. E acordando com o fuso de Roma ficou uma hora mais comprido. Vejo
o sol batendo, oblíquo, mas não dissimulado, na formidável nudez da pedra que sustenta o Cristo
Redentor, este nem está aí para mais (ou menos) uma hora na eternidade de seus braços escondidos.
O problema é meu – aliás, como todos os problemas, que só são problemas porque são meus.
Sem nada o que fazer, não tenho sequer o discutível consolo daquelas revistas atrasadas que os
consultórios colocam à disposição dos que esperam. Melhor mesmo olhar a Lagoa, que começa a ficar
mais bonita nessa época do ano, os barcos de regata, com a cor dos violinos, cortando as águas
iluminadas. Quando os remos sobem, gosto de ver o sol batendo nas pás encharcadas.
Há um dia pela frente, mas é como se não houvesse. Tenho essa coisa espantosa que é uma hora a
mais, hora que não perdi, tempo de que não chego a precisar. Um condenado à forca gostaria de uma
hora a mais? Se fosse esse o meu caso, certamente pediria que apressassem tudo, apreciaria até uma
hora a menos.
A ideia da forca não combina com dia que nasce, com a Lagoa que parece toda minha e só não é
minha exclusivamente porque tenho de reparti-la com o sol, com os barcos na cor dos violinos.
Deixo a varanda e me sinto inútil e desperdiçado. Nem Mila nem Tati me esperam para passear ao
sol. Pelo contrário: chegaram os jornais – como tudo fica feio de repente.
Rio de Janeiro, 10 de abril de 1997.
Carlos Heitor Cony. O homem desperdiçado. Em: Rogério Ramos (Org.) Histórias brasileiras de cães. Curitiba; positivo,
2016. P. 34.
01. Indique qual das alternativas abaixo melhor descreve os temas abordados na
crônica “O homem desperdiçado”.
(a) Perda de religiosidade, pena de morte e solidão.
(b) Solidão, saudade e falta de sentido para a vida.
(c) Passagem do tempo, saudade e espiritualidade.
(d) Alegria de viver, solidão de mais um dia de verão.
Soluções para a tarefa
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Resposta:
a letra C
Explicação:
EU ACHO Q É MAS POR FAVOR COLOCA COMO MELHOR RESPOSTA
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17
Resposta:
Explicação:
NÃO É LETRA C É LETRA B, ELE MESMO FALA
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