ME AJUDEM PORFAVOR É PRA HOJE
Leia o segundo segmento crônica:
Negócio de menino com menina
O pai, mais para atendê-la, apenas intermediário:
— Quanto você quer pelo passarinho?
— Não tou vendendo não senhor.
A menina ficou decepcionada e segredou:
— Ah, pai, compra.
Ela não considerava, ou não aprendera ainda, que negócio só se faz quando existe um vendedor e um comprador. No caso, faltava o vendedor. Mas o pai era um homem de negócios, águia da Bolsa, acostumado a encorajar os mais hesitantes ou a virar a cabeça dos mais recalcitrantes:
— Dou dez mil!
— Não senhor.
— Vinte mil.
— Vendo não.
— O homem meteu a mão no bolso, tirou o dinheiro, mostrou três notas, irritado.
— Trinta mil.
— Não vendo, não, senhor.
O homem resmungou “que menino chato” e falou pra filha:
— Ele não quer vender. Paciência.
A filha, baixinho, indiferente às impossibilidades da transação:
— Mas eu queria. Olha que bonitinho.
O homem olhou a menina, a gaiola, a roupa encardida do menino, com um rasgo na manga, o rosto vermelho de sol.
— Deixa comigo.
Levantou-se, deu a volta, foi até lá. A menina procurava intimidade com o passarinho, dedinho nas gretas da gaiola. O homem, maneiro, estudando o adversário:
— Qual é o nome deste passarinho?
— Ainda não botei nome nele, não. Peguei ele agora.
O homem, quase impaciente:
— Não perguntei se ele é batizado não, menino. É pintassilgo, é sabiá, é o quê?
— Aaaah. É bico-de-lacre.
A menina, pela primeira vez, falou com o menino:
— Ele vai crescer?
O menino parou os olhos pretos nos olhos azuis.
— Cresce nada. Ele é assim mesmo, pequenininho.
O homem:
— E canta?
— Canta nada. Só faz chiar assim.
— Passarinho besta, hein?
— É. Não presta pra nada. É só bonito.
— Você pegou ele dentro da fazenda?
— É. Aí no mato.
— Essa fazenda é minha. Tudo que tem nela é meu.
O menino segurou com mais força a alça da gaiola, ajudou com a outra mão nas grades. O homem achou que estava na hora e falou já botando a mão na gaiola, dinheiro na outra mão.
— Dou quarenta mil, pronto. Toma aqui.
— Não senhor, muito obrigado.
O homem, meio mandão:
— Vende isso logo, menino. Não tá vendo que é pra menina?
— Não, não tou vendendo não.
— Cinquenta mil! Toma! — e puxou a gaiola.
Com cinquenta mil se comprava um saco de feijão, ou dois pares de sapatos, ou uma bicicleta velha.
O menino resistiu, segurando a gaiola, voz trêmula.
— Quero não senhor. Tou vendendo não.
— Não vende por quê, hein? Por quê?
O menino acuado, tentando explicar:
— É que eu demorei a manhã todinha pra pegar ele e tou com fome e com sede, e queria ter ele mais um pouquinho. Mostrar pra mamãe.
O homem voltou para o carro, nervoso. Bateu a porta, culpando a filha pelo aborrecimento.
ÂNGELO, Ivan. In: O ladrão de sonhos e outras histórias. São Paulo, Ática, 1994
Arrogância: qualidade ou caráter de quem, por suposta superioridade moral, social, intelectual ou de comportamento, assume atitude prepotente ou de desprezo com relação aos outros; orgulho ostensivo, altivez.
Indique duas frases e duas atitudes do fazendeiro que revelem sua arrogância.
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Resposta:
"O homem voltou para o carro, nervoso. Bateu a porta, culpando a filha pelo aborrecimento."
"— Não perguntei se ele é batizado não, menino. É pintassilgo, é sabiá, é o quê?"
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